Endometriose afeta 8 milhões de brasileiras e pode ser incluída no rol de doenças que garantem o acesso ao auxílio-doença e à aposentadoria por invalidez. Sua principal causa de dor pélvica, infertilidade feminina e absenteísmo no trabalho. Marcos Maia, médico ginecologista, esclarece como controlar a doença e garantir saúde e bem-estar das pacientes
Nos últimos anos, o Brasil tem testemunhado um aumento significativo nos casos de endometriose, condição ginecológica que afeta a qualidade de vida de, pelo menos, 8 milhões de mulheres em todo o país. A doença se popularizou após a cantora Anitta, em 2022, ter revelado sofrer da doença e, enquanto estava no BBB 24, a cantora Wanessa Camargo também ter comentado sobre o desconforto que a levou a descobrir a condição.
“O impacto da endometriose na qualidade de vida das mulheres é inegável, considerando ser a principal causa de dor pélvica, infertilidade feminina e absenteísmo no trabalho”, explicou Marcos Maia, ginecologista especializado em dor feminina. Estudos recentes, como o publicado pela revista científica Reproductive Sciences e que conta com a participação de médicos brasileiros, corrobora essa afirmação: a condição afeta entre 10 e 15% das mulheres em idade reprodutiva no Brasil e quando as pacientes relatam uma dor classificada como 7 ou mais, em uma escala de 0 a 10, o impacto na qualidade de vida é ainda maior.
Para lidar com esses desafios, está em tramitação na Câmara dos Deputados, em caráter conclusivo, o Projeto de Lei 1069/23 que propõe medidas para melhorar o suporte às mulheres com endometriose. Também conhecida como a “Lei da Endometriose”, a proposta reconhece a doença como incapacitante, sendo ela incluída no rol de doenças que garantem o acesso ao auxílio-doença e à aposentadoria por invalidez, sem exigência de carência. Além disso, a mulher afetada teria direito a tratamento integral pelo Sistema Único de Saúde (SUS), incluindo atendimento multidisciplinar, acesso a exames complementares, assistência farmacêutica e modalidades terapêuticas reconhecidas, como fisioterapia e atividade física.
“Trata-se de uma condição ginecológica na qual o tecido que normalmente reveste a parte de dentro do útero, chamado endométrio, cresce fora do útero, principalmente na região pélvica das mulheres em órgãos como os ovários, bexiga e intestino que não tem cura, mas sim tratamento para controle”, explicou o médico.
Michele Santos Rodrigues, 35 anos, levou três anos para ter o diagnóstico correto de endometriose. Até lá, os sintomas geraram prejuízos para sua saúde e carreira. “Eu sentia dores intensas que só passavam com remédio na veia e olhe lá! Foi então que meu médico pediu exames específicos e, três anos depois do primeiro sinal, saiu meu diagnóstico”, conta.
Os principais sinais foram dores muito intensas durante o ciclo menstrual ao ponto de não conseguir se levantar para ir trabalhar e fazer suas tarefas diárias neste período, e ciclos irregulares. “A dor pode apresentar piora durante o período menstrual, sendo este o principal alerta para a possibilidade de endometriose. Mas há outros indícios da doença como as dores durante o ato sexual e dor ao evacuar ou urinar”, explicou Marcos Maia.
Endometriose: Exames essenciais para o diagnóstico correto
O diagnóstico da endometriose pode ser feito por meio de exames clínicos e laboratoriais. O primeiro é uma avaliação ginecológica minuciosa, conduzida por um profissional especializado, onde o exame de toque vaginal avalia as condições da vagina, ovários, útero, trompas, dentre outros.
Quando há suspeita da doença, o médico tende a encaminhar a paciente para a coleta de exame de sangue CA 125, que serve para auxiliar no diagnóstico e também no seguimento da paciente, avaliar a quantidade de proteínas CA-125 na corrente sanguínea. Valores aumentados de CA-125 podem indicar a presença de endometriose, de acordo com o ginecologista Marcos Maia.
Por fim, exames de imagem auxiliam na precisão da doença. Caso da ultrassonografia transvaginal para pesquisa de endometriose (não é o ultrassom transvaginal de rotina) que permite ao médico averiguar se há presença de lesões sugestivas à doença, e da ressonância magnética, um método eficaz para avaliar e diagnosticar a doença. Por meio de imagens de alta definição de todas as áreas e órgãos, este exame realiza o mapeamento profundo em locais não acessíveis ao ultrassom.
Principais tratamentos para controle da doença
A endometriose não tem cura, mas os tratamentos reduzem os sintomas e melhoram a qualidade de vida da mulher. No Brasil, a abordagem pode incluir desde medicamentos para aliviar a dor até intervenções cirúrgicas minimamente invasivas para remover a doença.
“Há indicação para dois tipos principais de tratamento: o clínico, que visa inibir a ação do estrogênio, hormônio responsável pela proliferação celular que estimula o crescimento das células endometriais. E o tratamento cirúrgico, que pode ser feito com a ressecção das partes afetadas por laparoscopia ou robótica, que é realizada com precisão para minimizar danos aos tecidos”, explicou o especialista
Os principais objetivos são proporcionar alívio da dor, viabilizar a gravidez para mulheres que assim o desejam e evitar a recorrência da doença. Segundo Marcos Maia, o tratamento pode envolver o uso de medicamentos, intervenções cirúrgicas, ou uma combinação de ambos.
Terapia hormonal é uma opção
O ginecologista explica que qualquer tratamento para endometriose deve incluir a inibição do hormônio estrogênio. Para isso, são utilizados diversos métodos contraceptivos e anticoncepcionais, que atuam de maneira eficaz. Além disso, progestágenos isolados também são empregados com sucesso no tratamento.
“Dentre essas abordagens, é importante ressaltar o sistema intrauterino de levonorgestrel, popularmente conhecido como DIU medicado. Este método desempenha uma função significativa no alívio das dores e na diminuição do sangramento uterino. É relevante destacar também que o DIU medicado não afeta a ovulação, mas sim reduz a atividade estrogênica na cavidade uterina”, esclareceu o médico.
Infelizmente, não há estudos conclusivos sobre a causa da endometriose, o que dificulta a definição de uma estratégia de prevenção da doença.
Também não há a confirmação de fatores de riscos, o que se sabe é que há algumas condições associadas como obesidade, faixa etária correspondente ao período fértil da mulher, mais comumente entre 30 e 40 anos, início precoce das menstruações, cirurgias uterinas como cesariana, remoção de mioma ou dilatação e curetagem, malformações uterinas, ciclos menstruais curtos, duração do fluxo menstrual aumentada e estenoses cervicais.
Para mais informações sobre endometriose e opções de tratamento, as pacientes devem consultar seus médicos ginecologistas e obter orientações personalizadas.
Sobre o médico Marcos Maia
Marcos Maia é médico ginecologista formado pela Universidade São Camilo (2016) com Residência em Ginecologia e Obstetrícia do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual (IAMSPE, 2017-2020) e também especialização em Oncologia Ginecológica (IBCC, 2020-2022).
É, também, especialista em Patologia do Trato Genital Inferior (PTGI) pela Associação Brasileira de Patologia do Trato Genital Inferior e Colposcopia (ABPTGI) e em Endoscopia Ginecológica e Ginecologia e Obstetrícia pela Febrasgo – TEGO (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia).
Possui especialização em Administração Hospitalar e de Sistemas de Saúde (Fundação Getúlio Vargas, 2021-2022).
Sempre buscou aprimoramento profissional na área da saúde da mulher e políticas de saúde pública. Organizador e co-autor do Guia Prático de Saúde da Mulher e com participação na elaboração de capítulos do livro: sobre Epidemiologia e Saúde Coletiva.